terça-feira, 24 de março de 2020

Recado Para Um Amigo Solitário

Quando chegar na tua casa
E encontrar solidão
Lembre de mim
Que também vivo só

Quando encontrares a paz
Mande uma carta pra mim
Quero saber
Como fazer
Pra ser feliz tanto assim

Uma canção deve haver
Para fazer entender
Que nada tenho a dizer
Quando o jeito é viver

(Paulinho Pedra Azul)

segunda-feira, 2 de março de 2020

"Ninguém irá me surpreender, a menos que você o faça."

ouso pensar que vieste
para me encantar
onde só ganhara desenganos.

a impessoalidade como lei
é um ledo engano.
não tenho medo do pranto.

no entanto, não me arrisco
a dizer em voz alta.
tanto desejo e tanto espanto.

SATÂNIA

Nua, de pé, solto o cabelo às costas,
Sorri. Na alcova perfumada e quente,
Pela janela, como um rio enorme
De áureas ondas tranqüilas e impalpáveis,
Profusamente a luz do meio-dia
Entra e se espalha palpitante e viva.
Entra, parte-se em feixes rutilantes,
Aviva as cores das tapeçarias,
Doura os espelhos e os cristais inflama.
Depois, tremendo, como a arfar, desliza
Pelo chão, desenrola-se, e, mais leve,
Como uma vaga preguiçosa e lenta,
Vem lhe beijar a pequenina ponta
Do pequenino pé macio e branco.

Sobe... cinge-lhe a perna longamente;
Sobe... — e que volta sensual descreve
Para abranger todo o quadril! — prossegue.
Lambe-lhe o ventre, abraça-lhe a cintura,
Morde-lhe os bicos túmidos dos seios,
Corre-lhe a espádua, espia-lhe o recôncavo
Da axila, acende-lhe o coral da boca
E antes de se ir perder na escura noite,
Na densa noite dos cabelos negros,
Pára confusa, a palpitar, diante
Da luz mais bela dos seus grandes olhos.

E aos mornos beijos, às carícias ternas
Da luz, cerrando levemente os cílios,
Satânia os lábios úmidos encurva,
E da boca na púrpura sangrenta
Abre um curto sorriso de volúpia...
Corre-lhe à flor da pele um calefrio;
Todo o seu sangue, alvoroçado, o curso
Apressa; e os olhos, pela fenda estreita
Das abaixadas pálpebras radiando,
Turvos, quebrados, lânguidos, contemplam,
Fitos no vácuo, uma visão querida...

(...)

Olavo Bilac