sábado, 3 de dezembro de 2016

Loucos e Santos (Oscar Wlide)

Escolho meus amigos não pela pele
ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.
Tem que ter brilho questionador
e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito
nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias
e aguentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco.

Quero os santos, para que não duvidem
das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo,
quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim:
metade bobeira, metade seriedade.

Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade
sua fonte de aprendizagem, mas lutam
para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade infância e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam o valor
do vento no rosto; e velhos, para que nunca
tenham pressa.

Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que 'normalidade' é uma ilusão imbecil e estéril.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Colam-se corações partidos

não oferecemos o amor da sua vida
nem um relacionamento sério duradouro
nem desilusões disfarçadas de planos

não queremos que crie expectativas
nem que sonhes acordada pra depois, com dissabor,
ficar se perguntando se tudo aquilo vivido teve real valor

picolé de chocolate com pedaços pra sarar essa febre romântica
oferecemos cafuné e conversas bobas ao pôr-do-sol
tem brincadeiras pra rir e pra suar o lençol 

se sua dor diminuir com essas andanças
acompanhamos em caminhadas pela praia
ou num xadrez na mesa da praça

viajamos por lugares rotineiros
vivemos de meros devaneios
dançamos no ritmo do vento

dançamos no cair da chuva
tomamos banho de mar
também nos banhamos sob a luz da lua

rimos de piadas que não tem graça
contamos outros causos em desgraça
pra te ver sorrir, vale qualquer palhaçada

quando se sentir melhor, é aí que viramos pó
compromisso é responsabilidade demais
não se promete aquilo de que não é capaz



quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Pensei

Que querias tanto quanto eu e
Que serias todo o meu querer
Em um só ser

Senti
Que podia confiar nesse querer
Que podia me entregar a você
Sem me perder

Sonhei
Com um amor recíproco
Não só no sentimento de querer estar junto
Mas no fazer acontecer estar junto e estar bem

Me equivoquei, meu bem.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

"Eles têm razão,

essa felicidade
ao menos com maiúscula não existe.
Ah, mas se existisse com maiúscula
seria semelhante à nossa breve pré solidão.
Depois da alegria a pré solidão,
depois da plenitude vem a solidão,
depois do amor vem a solidão.

Sei que é uma pobre deformação,
mas o certo é que nesse minuto duradouro
nos sentimos sós no mundo,
sem ocasiões,
sem pretextos,
sem abraços,
sem rancores,
sem as coisas que unem ou separam.

E nessa única forma de estar só
nem sequer nos apiedamos de nós mesmos.
Os dados objectivos são como seguem:
há dez centímetros de silêncio
entre tuas mãos e minhas mãos,
uma fronteira de palavras não ditas
entre teus lábios e meus lábios,
e algo que brilha assim de triste
entre teus olhos e meus olhos.

Claro que a solidão não vem só,
se olhamos sobre o ombro triste
de nossa solidão
se verá um largo e compacto impossível,
um simples respeito por terceiros e quartos
esse transtorno de ser boa gente.

Depois da alegria,
depois da plenitude,
depois do amor
vem a solidão!

De acordo,
mas que virá depois
da solidão?

Às vezes não me sinto tão só...
se imagino
melhor dito, sei
que além da minha solidão
e da tua
outra vez estás vós
ainda que perguntando-me a sós
que virá depois da solidão?"

- Mario Benedetti -

Inferno astral

Foi uma semana da qual não sinto saudades mas não esqueço. Talvez algumas semanas. Eu só queria que passasse o mais rápido possível.

As coisas não estão legais, bem longe disso. Eu não sei o que é preciso pra ficar legal. E essa falta de conhecimento é mais do que um apelo. Sem metas, objetivos, sem alegria nem tristeza. Pra onde foi minha vontade de viver ou simplesmente de fazer alguma coisa? Nesse momento, eu apenas existo. Apenas sobrevivendo, o porquê ainda não se sabe.
Eu poderia estar transbordando como sempre, cheia de palavras, de visões, ideias explodindo na minha cabeça, com opinião pra tudo mas não. Só vazio. Um imenso, profundo e agoniante vazio. É sufocante. O vazio sufoca. Quanto mais tento respirar, sentir algum tipo de felicidade ou infelicidade, mais apertado fica, não conseguir encontrar o que me faça sair do lugar.
Onde está todo mundo? Por que eles me abandonaram? Eu não entendo.

110

As conversas não rendem mais. Os olhares saudosos se cruzam mas já não sentem mais nada. Já não sentem vergonha, já não sentem prazer. As mãos bobas deixaram de ser bobas. Tudo o que tinham pra dizer... tudo o quê mesmo?

Mas afinal, eles não eram um casal.

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

mesmerize the simple minded, propaganda leaves us blinded

Apareceu uma preta do black na tv,
tem outra na propaganda de maquiagem
Minorias ganhando espaço na mídia, será miragem?

Senhores brancos e ricos mandam e desmandam no que podemos assistir
Você acredita que esses senhores se preocupam com você?
Se utilizam desses discursos de aceitação porque querem vender

Vender e ditar meu comportamento
Ser preta pode, mas tem que ser pop
militantes das causas certas não dá ibope

Falam em visibilidade... seria ingenuidade?
Só vejo todo mundo escravo consumindo banalidade
fazendo parte do problema, achando ser solução

Na sociedade perpetua a discriminação
não respeitam minha cor, minha raiz, minha dor
qualquer minoria continua sendo (mal)tratada como inferior

Do que me adianta aparecer na novela,
se o preconceito continua sendo nossa mazela?
Assédio moral, sexual, baixa auto-estima, violência policial reina na favela

Minha visibilidade sou eu mesma quem faço
sem precisar aparecer em nenhuma rede esgoto de televisão
Alguns tentam me humilhar, muitos veem com admiração

Só porque tomei a atitude destemida de me amar
e amando ao próximo enxerguei outras saídas
a luta nas ruas, organizando as famílias, é o que mudará nossas vidas





quinta-feira, 15 de setembro de 2016

~ Henry David Thoreau, “Walden” ou “A Vida nos Bosques”

“Com a minha experiência aprendi ao menos isso:
que se uma pessoa avançar confiantemente na direção de seus sonhos e se esforçar por viver a vida que imaginou, há de se encontrar com um sucesso inesperado das horas rotineiras.
Há de deixar pra trás uma porção de coisas e atravessar uma fronteira invisível; leis novas, universais e mais abertas começarão por se estabelecer ao redor e dentro dela; ou as leis velhas hão de ser expandidas e interpretadas a seu favor num sentido mais liberal, e ela há de viver com a aquiescência de uma ordem superior de seres.
A medida que ela simplificar sua vida, as leis do universo hão de parecer menos complexas, e a solidão não será mais solidão, nem a pobreza será pobreza, nem a franqueza, fraqueza.
Se construíres castelos no ar, não terá sido em vão seu trabalho; eles estão onde deviam estar. Agora colocai os alicerces por baixo.”

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

provaremos as ilhas e o mar

sei que em alguma noite

em algum quarto
logo
meus dedos abrirão
caminho
através
de cabelos limpos e
macios

canções como as que nenhuma rádio
toca

toda a tristeza, escarnecendo
em correnteza.


li Bukowski, pensei em Ribas.  

Mormaço

Promessas do descaso:
Uma educação que não me prepara para a vida,
Informações inúteis para o meu dia-a-dia,
Um governo que não se dá ao trabalho
de se preocupar com seus governados.
Vivem no consumo exagerado, desavisados
Só percebem o mal quando já foi feito o estrago.

do progresso ao atraso:
Plantar árvore faz nascer agua, disso eu não sabia
A tv que me faz de bobo da corte todo santo dia
Entre verdades covardes e mentiras, põe a culpa no clima;
Esconde os grandes empresários desmatando,
Sonega  as grandes empresas desperdiçando
Os recursos que em nossas casas estão faltando.

súplica ao acaso:
Tomando banho de água salgada no chuveiro
Quando cai água é correria o dia inteiro
Sobe, olha o tanque, doloroso vazio
Desce, bate bomba, esperança sem fastio
Será que o céu não se comove?
A dúvida assusta, nessa lógica injusta,

dia lindo é quando chove.

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Ítalo Calvino em As Cidades Invisíveis

- O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço. 

às vezes fico pensando...

a violência me faz meditar
entrar no profundo eu
percebendo as coisas a me circular
e a maneira como estão organizadas
e então encontrar outra maneira
de desorganizá-las

enquanto a passividade me revolta
observo a falta de ação do nós
facilmente corruptíveis
minimamente satisfeitos
comumente acomodados
reféns do destino que outros escolheram

me preocupa estarmos ocupados
com futilidades
me ocupa estar preocupada
em achar soluções
ansiosa para que o novo venha logo
desejando um salto de evolução
em cada indivíduo
buscando a revolução social
para o bem estar geral

pergunto aos astros, à lógica
aos pensadores antigos
porque é fácil pra mim perceber a tudo isso
e dificil a todos eles refletirem sobre isso
deixando o velho pra trás
por que perder tempo tentando melhorar
algo que já experimentamos não ser bom
nem fácil de mudar?

a resposta vem sendo mostrada aos poucos
pessoas se distanciando da sociedade
em valores e princípios e verdades
em vilas e comunidades sustentáveis
usando o melhor da sapi-ciência
para o bem maior da existência


quarta-feira, 24 de agosto de 2016

pelo direito de ser um deus. esse direito agora é meu.


Somos a parte do universo que se tornou consciente de si mesma. Não sei se é a verdade, mas é uma verdade que uso para me engrandecer, para me orgulhar e não me entregar.

Me entregar a quê?
A essa insanidade lúcida que é a sociedade: acordar cedo pra ficar dez horas trabalhando, ter uma vida mediocremente confortável sem reclamar, ou até reclamando, mas sem fazer nada a respeito.
Ou a essa lucidez insana que é estar desajustado e até conseguir lutar contra o preconceito, contra o pensamento e comportamento padrão, mas se sentir perdido a ponto de não mais suportar esse fardo e se jogar em tentação.

Porque outra verdade que tomo como minha é que se você olha para o abismo, ele olha direto pra você. E esse convite de voltar ao nada é tão tentador como o de ser o tudo. E apesar de ter esses pensamento obsessivos, de estar em constante flerte com a morte e me considerar uma suicida em potencial, nunca cheguei perto de tentar nada.

Por orgulho.
Gosto tanto de pensar que sou dona de mim mesma, que, por saber que as maiorias das decisões da minha vida não dependem de mim, mas de outros que nem sabem da minha existência, me sinto um tanto aliviada por só eu mesma controlar minha mente.
E tudo que se torna nocivo a mim, eu os culpo. Se tenho essa vontade mortal, é culpa deles. E por causa deles, eu não vou sucumbir, não. Através deles que eu vou expandir. Usando-os para evoluir.

Chego a pensar que o suicídio é um luxo, vaidade. Coisas que não tenho. Pessoas dependem de mim. São nessas pessoas que penso quando não sei mais o que pensar.
Os pensamentos ruins, meus monstros internos sempre me acompanharão, eu sei, mas nunca tomarão a frente de controle. nunca. Me usem. me estuprem. me espanquem; mas só me derrubarão se eu me deixar ser derrubada.

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Slam #1

Antiquados

Por uma injustiça histórica,
o negro foi escravizado, animalizado
"Raça inferior e amaldiçoada"
Argumentos de uma religião controlada
E de uma ciência privatizada
Era colonial, racismo atemporal, fruto do capital
Para alguns lucrarem, muitos devem ir mal
Branco europeu pra cá veio explorar
Negro africano, coagido, veio de lá
Marginalizado, sem política social
Morrendo nas periferias, como se fosse banal
Sem escola, nem universidade
Sem bons empregos... nenhuma novidade
Racista se diz superior, pensamento alienado
Na real, preto é só uma cor, mas traduz a dor
De quem precisa ser explorado, condenado
Pros senhores continuarem no pecado
Do consumo exagerado e do ócio privador

Dinheiro manchado de sangue
pra suprir comodidades
O ouro reluz, seduz, mas não se engane,
quanto maior a riqueza, maior a crueldade
Um sistema que me impõe conceitos ultrapassados
Me quer condenada ao antiquado
Um passado que não passou,
pelos grandes burgueses se instalou
Nas mentes pequenas de quem se acomodou
A PM que só violenta preto e pobre:
Esse alto índice de morte é fascismo
Irmãos sofrendo nas mãos do racismo
Meu campo de batalha é a rua
Sou mulher, negra, periférica, essa é a minha luta
A polícia quer me coagir, o Estado, me punir 
E a mídia quer me confundir
mas sou dona de mim,me livrei do mercado
Não tenho preço, meu prazer não é pecado
Longe de esteriótipos, não sou santa nem puta
Pensamento limitador não condiz com minha conduta
De consciência tranquila, alma leve, continuo atuando
Corpo fechado, mente aberta, sexo pulsando
Não vou me deixar escravizar, tampouco me padronizar
Pela ditadura estética que só quer me clarear
Orgulho de África, aceito minha raiz
Levanto a cabeça, não vou sucumbir
Viver e não ter a vergonha de ser feliz...





sexta-feira, 12 de agosto de 2016

A Flor e a Náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas, 
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias, espreitam-me.
Devo seguir até o enjoo?
Posso, sem armas, revoltar-me?

Olhos sujos no relógio da torre:

Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre.
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

Vomitar este tédio sobre a cidade.

Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?

Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.

Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.




Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, 29 de julho de 2016

da série "jornal incoerente, programação inconveniente, sociedade decadente"

Acordei.
E até então me parecia um dia normal.
A televisão ligada na sala pra ninguém assistir. Nada anormal, a não ser o fato de que sete horas da manhã, seja absolutamente necessário que você saiba que no Rio de Janeiro há arrastões com muita frequência e que em São Paulo qualquer um pode ser assaltado e morto a qualquer hora e que lá em Minas Gerais policiais foram acusados de matar uma criança.
Quem eles culpam? Os favelados, os pobres de periferia, os pretos. Eu os vi falando que isso tem que acabar, que a polícia tem que ser mais dura e que a justiça brasileira tem que funcionar. Não ouvi comentarem nada sobre a pobreza e a exclusão que geram a criminalidade, não ouvi sobre partidos e empresas que lucram com essa criminalidade, não ouvi sobre os juízes e políticos que criam e mudam leis para benefício próprio e desconhecem o real significado de justiça.
Na tv assim como na vida real, só vi o medo coletivo e a indignação seletiva. Nada de novo porém muito anormal. Acredito eu, que se se mostrasse ideias inovadoras, atitudes solidárias e soluções criativas e humanas para os problemas, as pessoas se sentiriam bem e ao sair para trabalhar ou estudar, estariam incentivadas a dar o melhor de si para si e para os outros.
Mas não, jornal matinal tem que mostrar carnifica mesmo. É preferível que estejamos com medo uns dos outros, nos odiando violentamente do que nos amando loucamente.
Siga sem pensar e tenha um bom dia, Brasil.


sem nome, nem fim ainda


diziam eles
é melhor não ser ninguém
não ter verdade alguma
e estar sempre preparado
para verdade nenhuma
coisa sensata
diziam eles

mas o que me sobra pra ser?
em que devo acreditar?
a quem destino esse desatino
que não é de ninguém?
não sei ser, nem não ser
e me entrego ao total desconhecido

quisera eu ter tantas convicções
e não me afogar em angústias confusões
ora fosse alguém
cheio de certezas
talvez banais fossem elas
talvez débil fosse eu
menor seria meus lamentos?

quinta-feira, 21 de julho de 2016

como já dizia vinicius de moraes: bateu a bad

não dou o mesmo valor às coisas que as pessoas dão.

talvez elas se importem demais
talvez eu me importe de menos
e isso me deixa constantemente aflita
porque mesmo que elas se importem demais
ou que eu me importe de menos
não gosto de ferir ninguém que não mereça
com a minha indiferença ou dureza
das palavras e dos gestos
mesmo que isso ocorra com frequência.
quando me cobram coisas que não posso e não consigo,
eu não faço
mas a maioria das pessoas não entendem
elas não pensam que eu possa estar
tão doloridas quanto elas ao recusar.
elas me acham egoístas.

talvez eu me importe demais
ou elas se importem de menos
a ponto de não perceberem 
que o que elas exigem de mim pesa e dói 
talvez por me importar demais
e elas se importarem de menos
eu não as culpo e
acabo ferindo a mim a mesma 
quando não falo o que deveria, 
quando não ajo como deveria
e depois eu fico cansada, angustiada
e sumo, enquanto o outro fica
e continuamos cada um do seu lado, 
mutilados. 
porque dizer não às vezes é tão difícil? 
porque é mais fácil deixar acontecer
mesmo que isso acabe com minha sanidade?
o que eu queria de verdade era que todas estivessem felizes
mas elas não sabem disso
e esperam demais algo que não irei fazer
eu as acho egoístas. 

não é natural estarmos assim
perdidos. 

eu não entendo porque os meus pensamentos tendem a ser tristes
eu não entendo porque me sinto mais confortável em desgraça
eu não entendo porque sempre espero o pior
eu não entendo o porquê desse choro preso
eu não entendo porque as lágrimas chegam aos meus olhos mas não consigo chorar
eu não entendo porque me recuso a demonstrar
eu não entendo porque gosto tanto desse blues melancólico

eu só queria entender. 

a tristeza já e tão íntima
que até encontro prazer nela
algo como uma amante.
mas às vezes é tanta
que acho que não vou aguentar
normalmente dá pra fugir
mas ocasionalmente ela consegue me alcançar
e  não deixa barato 
até que tudo passa.
e acontece outra vez.

domingo, 17 de julho de 2016

Expansão

Ela olhou pro céu. A mais antiga forma de expandir a mente humana. Talvez seja por isso que nos queiram de cabeça baixa, múltiplas hipóteses foram levantadas, derrubadas ou aceitas meramente olhando-se para o céu. Esse infinito abismo que nos espera. E aquilo lhe entorpeceu. A mais antiga droga alucinógena da humanidade: a curiosidade. Pelo pouco conhecimento que tinha, tentou imaginar o que estava a acontecer no mundo nesse mesmo instante em que olhava pro céu. Imaginação, esse infinito abismo que nos contempla.

Uma menina jogada no lixo na populosa, poderosa e desesperada China.
Uma outra menina ansiosa esperando o telefonema de um carinha da noite anterior.
Um garotinho que mal sabe falar e já o drogaram e já o deram uma arma e já matou muitos outros garotinhos num desses países africanos ensanguentados de guerra civis.
Um outro garotinho que vai cursar direito só para agradar ao pai.
Uma baleia jubarte vindo de águas geladas pra desovar em águas quentinhas nordestinas.
Uma tartaruga sufocada com uma sacola plástica no saturado Pacífico.
Uma crise sócio-política prestes a deixar milhares de pessoas sem emprego.
O religiosos e seu falso moralismo. Os liberais e seu fascismo. Os libertários e seu rebeldismo.
A teoria da relatividade e a da conspiração.
A sua própria super-teoria das super-todas as coisas. 

- De onde viemos? Para onde vamos? Qual sentido da vida? 
Não sei e suponho ser essa minha única certeza: nunca saberei. 7 bilhões de pessoas cercadas de tantos outros seres no mundo e isso não significa absolutamente nada. Como gigantes num universo de super-gigantes ou megabytes num sistema de terabytes. Um mundo cercado de bilhões de estrelas e tantos outros mundos. Uma luz que pisca entre todos os pisca-pisca do natal. 

E é por isso que não aceito a sociedade como ela é. Agem como se fossem os únicos, mas não são. Agem como se houvesse uma verdade absoluta sobre comportamento e regras, mas não há.  Acham, no alto de sua ignorância, que aparência e ambição vestida de conforto são importantes. Milhões e milhões de espaço esperando para serem explorados, milhões e milhões de partículas excitadas para serem descobertas e me querem atrasada, limitada, mesquinha. Sinto decepcioná-los, mas não posso contrariar a essência: diante da incerteza e movimento do infinito abismo, permanecerei sempre de mente e asas abertas, buscando expansão. E mesmo que não possa mudar o todo, posso ajustar a mim mesma, uma parte do todo, para ser o mais próximo de Universo que conseguir, porque o sou e ele me é. Ora caos, ora harmonia e o equilíbrio entre eles.


quinta-feira, 14 de julho de 2016

Paris, 29 de março de 1845

Continuo a ser eu próprio, como antes, inimigo declarado da realidade existente, só que com uma diferença: eu parei de ser um teórico, eu venci, enfim, em mim, a metafísica e a filosofia, e entreguei-se inteiramente, com toda a minha alma, ao mundo prático, ao mundo dos factos reais.

Acredite em mim, amigo, a vida é bela; agora tenho pleno direito de dizer isto porque parei há muito tempo de olhá-la através das construções teóricas e de conhecê-la somente em fantasia, pois experimentei efectivamente muitas das suas amarguras, sofri muito e entreguei-me frequentemente ao desespero.

Eu amo, Paulo, amo apaixonadamente: não sei se posso ser amado como gostaria que fosse, porém não me desespero; sei, pelo menos, que tem muito simpatia por mim; devo e quero merecer o amor daquela a quem amo, amando-a religiosamente, ou seja, activamente; ela está submetida à mais terrível e à mais infame escravidão e devo libertá-la combatendo os seus opressores e incendiando no seu coração o sentimento da sua própria dignidade, suscitando nela o amor e a necessidade da liberdade, os instintos da rebeldia e da independência, fazendo-lhe recordar a sensação da sua força e dos seus direitos.

Amar é querer a liberdade, a completa independência do outro; o primeiro acto do verdadeiro amor é a emancipação completa do objeto que se ama; não se pode amar verdadeiramente a não ser alguém perfeitamente livre, independente, não só de todos os demais, mas também e, sobretudo, daquele de quem é amado e a quem ama.

Esta é a profissão da minha fé política, social e religiosa, aqui está o sentido íntimo, não só dos meus actos e das minhas tendências políticas, mas também, tanto quanto me é possível, da minha existência particular e individual; porque o tempo em que poderiam ser separados estes dois géneros de acção está muito longe da gente; agora o homem quer a liberdade em todas as acepções e em todas as aplicações desta palavra, ou então não a quer de modo algum; querer a dependência daquele a quem se ama é amar uma coisa e não um ser humano, porque o que distingue o ser humano das coisas é a liberdade; e se o amor implicar também a dependência, é o mais perigoso e infame do mundo porque é então uma fonte inesgotável de escravidão e de embrutecimento para toda a humanidade.

Tudo que emancipa os homens, tudo que, ao fazê-los voltar a si mesmos, suscita neles o princípio da sua vida própria, da sua actividade original e realmente independente, tudo o que lhes dá força para serem eles mesmos, é verdade; tudo o resto é falso, liberticida, absurdo. Emancipar o homem, esta é a única influência legítima e bem-feitora.

Abaixo todos os dogmas religiosos e filosóficos – que não são mais que mentiras; a verdade não é uma teoria, mas sim um facto; a vida é a comunidade de homens livres e independentes, é a santa unidade do amor que brota das profundidades misteriosas e infinitas da liberdade individual.


De: Bakunin 
Para: Paulo, meu irmão

quarta-feira, 6 de julho de 2016

JOVEM - Helena Kolody


Suporta o peso do mundo.
E resiste.

Protesta na praça.
Contesta.
Explode em aplausos.

Escreve recados
nos muros do tempo.
E assina.

Compete
no jogo incerto da vida.

Existe.



sexta-feira, 1 de julho de 2016

caretas contemporâneos

"Sério: nada contra se você fuma seu cigarro, sua maconha, cheira seu pó... mas pra que porra acender um incenso?! cheiro horrível, enjoativo!"

quarta-feira, 29 de junho de 2016

letra "Estado em emergência" - Pawlista&Maria [parte I]

Ignorância, o mal do milênio
3 meses sem aula, 2012, a Bahia merece um prêmio
de consolação, não tem educação, essa é a solução
de manter o cidadão nas rédeas
e o salário do corrupto acima da média

O problema é do estado, capital onipotente
governantes e bilionários, os verdadeiros delinquentes
Quem luta por melhoria, faz greve e é condenado
pela mídia é taxado de desocupado
Quem levanta a voz, apanha dos porcos fardados
vira réu de um crime em que o governo é culpado

Descaso, escola caindo aos pedaços
É a corrupção deixando seus rastros
Valores falidos, ônibus fudidos
Tudo entregue às traças,
não dá vontade de estudar em meio a essa desgraça
O aluno desprezado não tem futuro promissor
Professor, ensina por amor, já perdeu seu valor

Criança pobre passa fome e não tem merenda
O dinheiro foi pra cueca, isso pra mim é uma ofensa
Jaques Wagner veio inaugurar refeitório,
enquanto nós padecemos no ambulatório
Nós morrendo, vós sofrendo, eles superfaturados
Jabes Ribeiro a verba da saúde correu pra que lado?

Chega de discursos,
Não quero ser mais uma vítima da falta de recurso
que paga imposto, paga plano de saúde
mas na hora do sufoco: Deus nos ajude!
Pobre não pode ter doença que a morte é sua sentença
Estado em emergência
chegar ao fim do dia é questão de sobrevivência

E você em frente à TV, não consegue ver
Governo que desgoverna e só faz te fuder
O rico dita as regras, sempre foi assim
Luto contra esse sistema por você e por mim
Quem tem grana banca campanha e depois o povo apanha
Candidato eleito tem que facilitar,
benefícios e isenções só pro burguês lucrar

Por isso eles não querem te ver bem informado
Eles riem de você, tá tudo errado
Acorda! Baiano não é atrasado
Levanta, vamo lutar lado a lado
Se liga no que acontece, procure se informar
A conta deles só cresce e o povo fica ao "deus dará"

domingo, 26 de junho de 2016

O silêncio fala pra quem sabe ouvir

Só quem tem
Medo
Receio
da exposição
pode sentir.

As pessoas acomodadas não ouvem,
as individualistas não sentem.
Sempre apressadas, sempre correndo,
nunca escutarão o grito mudo
dos desamparados.

E é no meio do caos, da violência,
do egoísmo e da vaidade,
que eu os ouço perfeitamente.

É no meio desse caos, dessa violência,
desse egoísmo e vaidade
que eu os procuro. Os marginalizados.

Eles renunciaram à hipocrisia,
não se submeteram ao conformismo.
Rejeitaram os valores morais ultrapassados
e corruptos da sociedade.
Menosprezaram o dinheiro e o poder.

Sem amparo em meio ao caos e a violência
e à margem do egoísmo e da vaidade
É onde vivem
sem imposição
Se divertem
sem padrão
Se revoltam e
cantam a liberdade de estar
desamparados e marginalizados.

Só quem está igualmente
Inconformado
Incomodado
Angustiado
pode ouvi-los.

O inferno são eles para os outros

O fluxo do imperialismo
causando um tráfego de horrores.
Horrores que são vistos pelos meus olhos,
sentidos pela minha pele,
escutados pelos meus ouvidos,
vivenciados pela minha alma.
Venenos ingeridos.
Sentimentos nocivos à minha sanidade.
Recuo. Espero. Respiro lentamente.
Por mais desesperador que tudo possa parecer e é,
 ninguém pode (ainda) controlar meus devaneios.
Sendo assim, posso eu mesma
inventar o paraíso e permanecer nele,
dentro dele, dentro de mim, em mim, em paz.

Ideologia, eu quero uma pra viver

Diante de tantas atrocidades
intelectuais e físicas cometidas pela maior parte dos homens,
por que eu deveria me importar com eles?
Seria por um desejo egoísta de pode viver livremente o meu querer?
Teria eu pena altruísta de todos os ignorantes e escravos?

segunda-feira, 30 de maio de 2016

sobre esperar qualquer coisa de qualquer um

 Teresa,


se algum sujeito bancar o sentimental em cima de você
E te jurar uma paixão do tamanho de um bonde
Se ele chorar
Se ele se ajoelhar
Se ele se rasgar todo
Não acredita não, Teresa
É lágrima de cinema
É tapeação
Mentira
CAI FORA.


Manuel Bandeira

terça-feira, 24 de maio de 2016

amor no espaço-tempo

todo mundo ama e quer ser amado
mas falta espaço
e acho que o amor é isso: ter espaço para ser o que quiser
e dar espaço para que o outro seja também

todo mundo ama e quer ser amado
mas estamos fora de tempo
ao invés de procurar por soluções inovadoras
é preferível se apegar a tradições e pessoas do passado

todo mundo ama e quer ser amado
mas sobra violência
a primeira divergência de opinião
é o suficiente para ambas as partes discutirem e se agredirem

todo mundo ama e quer ser amado
mas perdemos o foco
é necessário mudar a si mesmo, ideologia, postura
e mudar o ambiente, solidariedade, luta.

terça-feira, 10 de maio de 2016

Velho Buk em O estouro

demais

tão pouco


tão gordo

tão magro

ou ninguém.


risos ou

lágrimas


odiosos 

amantes


estranhos com faces como

cabeças de

tachinhas


exércitos correndo através

de ruas de sangue

brandindo garrafas de vinho

baionetando e fodendo

virgens.


ou um velho num quarto barato

com uma fotografia de M. Monroe.


há tamanha solidão no mundo

que você pode vê-la no movimento lento dos

braços de um relógio.


pessoas tão cansadas, mutiladas
tanto pelo amor como pelo desamor.

as pessoas simplesmente não são boas umas com as outras
cara a cara.
os ricos não são bons para os ricos
os pobres não são bons para os pobres.

estamos com medo.

nosso sistema educacional nos diz que
podemos ser todos
grandes vencedores.

eles não nos contaram
a respeito das misérias
ou dos suicídios.

ou do terror de uma pessoa
sofrendo sozinha
num lugar qualquer
intocada
incomunicável
regando uma planta.

as pessoas não são boas umas com as outras.
as pessoas não são boas umas com as outras.
as pessoas não são boas umas com as outras.

suponho que nunca serão.
não peço para que sejam.
mas às vezes eu penso sobre
isso.

as contas dos rosários balançarão
as nuvens nublarão
e o assassino degolará a criança
como se desse uma mordida numa casquinha de sorvete.
demais

tão pouco
tão grodo
tão magro
ou ninguém
mais odiosos que amantes.

as pessoas não são boas umas com as outras.
talvez se elas fossem
nossas mortes não seriam tão tristes.

enquanto isso eu olho para as jovens garotas
talos
flores do acaso.

tem que haver um caminho.
com certeza deve haver um caminho sobre o qual ainda
não pensamos.

quem colocou este cérebro dentro de mim?
ele chora
ele demanda
ele diz que há uma chance.

ele não dirá
“não”.

terça-feira, 26 de abril de 2016

10.03

até ontem tudo me parecia possível
pós uma onda de guerras mundiais e depressão
a paz vinda de uma planta nos fez querer
mudanças e socializar direitos
a felicidade parecia nos sorrir finalmente
hoje o preconceito me faz chorar,
tantas pessoas humilhadas por conceitos ultrapassados
um pai desempregado com muitos filhos pra criar
vítimas de um sistema em eterna crise
ou uma mãe solteira carregando o mundo nas costas
a ser julgada e apontada no primeiro deslize
um pobre condenado por fumar e relaxar
a rica indústria farmacêutica me faz adoecer pra poder lucrar
um short que incomoda pelo seu pequeno tamanho
consegue esconder a hipocrisia machista desse rebanho
que é roubado e alienado por falsos pastores, inquisidores
exploradores da fé alheia
essas injustiças deixam minha cabeça cheia
a ponto de explodir, mas eles não ver os meus pedaços por ai
 muito pelo contrário, a raiva me dá a coragem para jamais me render
ou desistir

até ontem tudo me parecia tranquilo
podíamos sair às ruas, andar como camaradas
brindar a vida apenas pelo motivo de estarmos vivos
hoje já não podemos nos divertir juntos
mais que dois ou três pretos reunidos
é formação de quadrilha
e devem ser intimados, abordados, violentados
ainda que não sejam os culpados
pelos mesmos porcos fardados
que ao invés de estarem do lado da população
preferem proteger quem nos assassina
com o descaso nos hospitais e a falta de educação
e diante de tanto absurdo, ainda criminalizaram nossa manifestação
se exigimos tudo aquilo que é nosso por direito
por lei, viramos terroristas
mas o que é o terrorismo senão milhares de mortes
causadas por desvios de verbas e jogadas políticas?

até ontem eu acreditava em dias melhores
existia algo de esperançoso e poético
em "ordem e progresso" e "o país do futuro"
hoje a violência me faz ter medo de sair de casa
nos jornais, dizem que somos conformados
mas nos mostram a morte como coisa banal
abusos e corruptos como coisa normal
não nos falam dos verdadeiros bandidos
são, todos eles, aliados desses bandidos
os famosos "colarinho branco" que ninguém nunca sabe quem são
não falam das coisas boas que somos e fazemos
e assim acreditamos que somos incapazes de mudar
quando, na verdade, somos seres nascidos para evoluir

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Guerra aos senhores


Desatino destinado à escravização
Alienação que aponta pro caminho mais fácil
A sede de poder é o que os tornou culpados

E assim,
Um outro sistema é imposto
se alimentando da sua fraqueza e do seu desgosto
nessa vida controlada, tendo vontades castradas
não conseguindo suprir mínimas necessidades básicas

E assim,
Uma outra milícia se forma
Fica mais forte o cheiro de gente morta
colarinho branco monta o esquema sem sujar as mãos
dono da boca compra o esquema sujando os irmãos
a polícia já tá no esquema, sujou pra população

E agora que o menor caiu no esquema é sem perdão:
em três dias, três jovens assassinados
eram brigas entre raios, sacrifício de gado,
o sangue que suja o morro, foi planejado no Planalto

Mas nós inertes, acomodados
com a bunda no sofá, em frente ao celular
 ou vendendo na televisão
permitimos o mal se propagar onde deveria haver união
sobra criminalidade quando falta educação e inclusão

Enquanto isso, os malfeitores
Governantes que desgovernam
Reguladores que desregulam
senhores das nossas angústias
assistem das suas coberturas
os pobres tendo suas mortes prematuras

Numa disputa que tem por finalidade
acentuar ainda mais as desigualdades
eles, de helicóptero e avião da FAB nas alturas
e nós, nas ruas, sangrando em calamidade.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

sobre problematizações desnecessárias:

 Burrice muita é besteira pouca
me ofende em nada, relevo;
me elevo em tudo.

Daqui de cima, vejo lá embaixo o circo pegar fogo
Daqui de cima, minha cara se dissipa em fumaça
Quem não é livre jamais entenderá de liberdade.

Me ofender com besteira pouca?
Oxe, é burrice muita!
Tolero quase tudo, o que não for quase, desprezo.

Quem quer liberdade tem que deixar ser livre
se sentir livre e deixar pra lá.
Tanto muro a ser posto abaixo,
tanta ideia a ser seguida acima,

vou me envolver com burrice muita e besteira pouca?
Eu não.
Vou me desenvolver,
isso sim.
E qualquer problema que você tiver com isso é seu e só.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

E assim fui.

e aqui vou, entretida em mim mesma e no céu
me perguntando como dentro pode ser tão infinito quanto fora
como dentro é tão desconhecido e decisivo
e como fora é tão decisivo e desconhecido
sei o que penso mas me desconheço
como funciona os sentimentos?
como surgiram as primeiras convicções?
sei onde vivo mas o desconheço
como sentir o que não se pode medir?
como descobrir o caótico equilíbrio cósmico?

e aqui estou, caminhando
enquanto um cachorro esquelético passa frio
cabeça baixa, o olhar brilhante ofuscado pelo desprezo humano
me perguntando: por que assim
abandonado por dentro e por fora?
não difere da situação de muitos homens por aí
necessitados, isolados, invisíveis
em sociedades aglomeradas, insensíveis
eu pergunto: por quem assim?
alguém através da história quis assim
que outros alguéns no decorrer da história ficassem assim:
sistematizados

e aqui sou, uma praia num planeta de milhões de eras
tão bonita quanto a rotação da terra
sendo assassinada pela humana hostilidade
tão cruel como a gravidade
uns rapazes jogando bola
uns coqueiros enfeitando o horizonte
crianças cavando um buraco tão fundo que vai até a china
observar padrões, inventar histórias, minha sina
um amigo doente que não apareceu
e um céu nublado que me entorpeceu.