quinta-feira, 29 de setembro de 2016

"Eles têm razão,

essa felicidade
ao menos com maiúscula não existe.
Ah, mas se existisse com maiúscula
seria semelhante à nossa breve pré solidão.
Depois da alegria a pré solidão,
depois da plenitude vem a solidão,
depois do amor vem a solidão.

Sei que é uma pobre deformação,
mas o certo é que nesse minuto duradouro
nos sentimos sós no mundo,
sem ocasiões,
sem pretextos,
sem abraços,
sem rancores,
sem as coisas que unem ou separam.

E nessa única forma de estar só
nem sequer nos apiedamos de nós mesmos.
Os dados objectivos são como seguem:
há dez centímetros de silêncio
entre tuas mãos e minhas mãos,
uma fronteira de palavras não ditas
entre teus lábios e meus lábios,
e algo que brilha assim de triste
entre teus olhos e meus olhos.

Claro que a solidão não vem só,
se olhamos sobre o ombro triste
de nossa solidão
se verá um largo e compacto impossível,
um simples respeito por terceiros e quartos
esse transtorno de ser boa gente.

Depois da alegria,
depois da plenitude,
depois do amor
vem a solidão!

De acordo,
mas que virá depois
da solidão?

Às vezes não me sinto tão só...
se imagino
melhor dito, sei
que além da minha solidão
e da tua
outra vez estás vós
ainda que perguntando-me a sós
que virá depois da solidão?"

- Mario Benedetti -