quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Sempre fui miúda de desejos descabidos

miúda grotescamente poética
chata de coisas que chateiam
de pernas fininhas que depois engrossaram

As miúdas poéticas são bobinas de filmes, riscadas
são gaitas desafinadas
onde muitos passaram os lábios
mas não ficaram
as miúdas poéticas contemplam o suicídio
mesmo depois de uma taça de Corn Flakes
olham os telhados laranja de Lisboa
e pensam noutro sítio qualquer
semeiam flores para terem perfumes
matam-nas, por amá-las demais

as miúdas poéticas tem cabelos desmoronados
de beatas e perguntas
tem a roupa de detergente barato
e as unhas roídas à la carte
tossem devagarinho com medo
de agredir alguém
tem pose de girafa mas não chegam às arvores.

[Cláudia R. Sampaio, A PRIMEIRA URINA DA MANHÃ]


"Eu estava tão triste por nunca possuir algo de bom,

algo como ela,
que nada de bom nunca viesse a me pertencer.
Não porque eu estivesse sempre pobre de dólares,
mas porque eu era pobre em expressar-me a dois.
Eu era tão amarelo de covardia quanto o sol talvez,
mas também tão quente e verdadeiro quanto o sol
em algum lugar dentro de mim,
mas nunca ninguém acharia esse lugar."

[trecho de  As pessoas parecem flores finalmente. - Bukowski]