antes
nem
depois,
foi
tão
convincente
para quem
exercia
a
hegemonia,
nem
tão
inelutável
para
quem
a
sofria, escravo
ou
vassalo.
Desapossados
de
suas
terras,
escravizados
em seus
corpos,
convertidos
em
bens
semoventes
para
os
usos
que
o senhor
lhes
desse,
eles
eram
também
despojados
de
sua
alma.
Isso se
alcançava
através
da
conversão
que
invadia
e
avassalava
sua própria
consciência,
fazendo‐os verem‐se
a
si
mesmos
como
a pobre
humanidade
gentílica
e
pecadora
que, não
podendo
salvar se
neste
vale
de
lágrimas,
só
podia
esperar,
através
da
virtude,
a compensação
vicária
de
uma
eternidade
de
louvor
à
glória
de
Deus
no
Paraíso.
Tal
é
a
força
dessa
ideologia
que
ainda
hoje
ela
impera, sobranceira.
Faz
a
cabeça
do
senhorio
classista
convencido
de
que orienta
e
civiliza
seus
serviçais,
forçando‐os
a
superar
sua
preguiça inata
para
viver em
vidas
mais
fecundas
e
mais
lucrativas.
Faz, também,
a
cabeça
dos
oprimidos,
que
aprendem
a
ver
a
ordem social
como
sagrada
e
seu
papel
nela
prescrito
de
criaturas
de
Deus em
provação,
a
caminho
da
vida
eterna.
Essas
linhas
de
formação correspondem,
no
lado
nórdico {América do Norte},
à
formação
de um
povo
livre,
dono
do
seu
destino,
que
engloba
toda
a
cidadania
branca.
No
nosso
sul {América Latina},
o
que
se
engendra
é
uma
elite
de senhores
da
terra
e
de
mandantes
civis
e
militares,
montados
sobre a
massa
de
uma
subumanidade
oprimida,
a
que
não
se
reconhece nenhum
direito.
A
evolução
de
uma
e
outra
dessas
formações
dá lugar,
nas
mesmas
linhas,
de
um
lado,
ao
amadurecimento
de
uma sociedade
democrática,
fundada
nos
direitos
de
seus
cidadãos,
que acaba
por
englobar
também
os
negros.
Do
lado
oposto,
uma feitoria
latifundiária,
hostil
a
seu
povo
condenado
ao arbítrio,
à
ignorância
e
à
pobreza.
No
plano
histórico‐cultural,
os
nórdicos
realizam
algumas
das potencialidades
da
civilização
ocidental,
como
extensão sensaborona
e legítima
dela.
Nós,
ao
contrário,
somos
a
promessa de
uma
nova
civilização
remarcada
por
singularidades, principalmente
africanidades.
Já
por
isso,
aparecemos
a
olhos
europeus
como
gentes
bizarras,
o que,
somado
à
nossa
tropicalidade
índia,
chega
para
aqueles
mesmos olhos
a
nos
fazer
exóticos.
Não
somos
e
ninguém
nos
toma
como
extensões
de
branquitudes, dessas
que
se
acham
a
forma
mais
normal
de
se
ser
humano.
Nós não.
Temos
outras
pautas
e
outros
modos
tomados
de
mais
gentes. O
que,
é
bom
lembrar,
não
nos
faz
mais
pobres,
mas
mais
ricos
de humanidades,
quer dizer,
mais
humanos.
Essa
nossa
singularidade bizarra
esteve
mil
vezes
ameaçada,
mas
afortunadamente
conseguiu
consolidar‐se.
Inclusive
quando
a
Europa
derramou
multidões
de
imigrantes
que
acolhemos
e
até
o
grande
número
de
orientais
adventícios
que
aqui
se
instalaram.
Todos
eles,
ou
quase
todos,
foram
assimilados
e
abrasileirados."
livro O POVO BRASILEIRO de DARCY RIBEIRO; capítulo 3 O PROCESSO CIVILIZATÓRIO, páginas 72 e 73