sábado, 18 de novembro de 2017



Ontem percebi que ano que vem vão fazer dez anos que bebo. Entre idas e vindas, porres e ressacas, não estou mais feliz, realizada nem satisfeita mas pelo menos não me matei, não diretamente, não decisivamente. Aos poucos, talvez, ainda esteja me matando. Aos poucos, talvez, morremos desde que nascemos. Eu sei que historicamente o álcool foi a principal distração usado pelos exploradores nos povos conquistados para que permanecessem pacíficos embriagados e consumidores viciados assinando suas próprias sentenças de morte. E, atualmente, culturalmente vemos a bebida como um escape das obrigações e frustrações que enfrentamos diariamente. Escravos do século 21 que precisam de algum entretenimento para que esqueçam de lutar por um sistema melhor. Divertimento lícito de causa mórbida e futuro sombrio. Gerando capital para grandes empresas continuarem lucrando em cima da desgraça alheia. Mesmo consciente disso e de outras realidades degradantes, não sinto vontade de ser saudável, não sinto vontade de parar de beber, muito pelo contrário, caio na desgraça, feitiçaria e sedução por livre e espontânea pressão, por indecente e moldada vontade.

A todo momento me pergunto: o que você faz, Maria, daquilo que te fizeram? Parte de mim sente amor e quer transformar cada miséria em uma forma singela de gentileza e evolução. Como se assim, fosse superior a quem causa dor. Mas o exercício diário de convivência faz essa parte de mim ser muito pequena. A outra parte, que se faz mais presente, sente raiva e desprezo. Sente vontade de gerar violência e sentir dor. E assim me torno tão medíocre a ponto de sentir vergonha da minha capacidade de ser melhor e me orgulho por estar tão parecida com as pessoas à minha volta. Eu sinto vontade de fazer coisas ruins, não gosto, mas não me controlo também. E isso não é uma dualidade, senão uma mistura do que me ocorre todos os dias. Quero evoluir mas não quero ir sozinha.